Wednesday, September 27, 2006

Índios, assim como nós



Eu não sei bem por onde começar. Eu também não sei bem o que eu esperava dessa viagem para aldeia. Talvez uma cura miraculosa. Talvez um desvio de atenção. Confesso que agora estou um pouco deformada com tanto pensamento. O encantamento tem dessas coisas. Mas vamos ao que precisa ser dito. No meio do cerrado, imerso na areia seca e entre as árvores retorcidas, moram os índios krahô. Foi lá que fomos parar, com nossos entulhos e apetrechos de sobrevivência. Uma viagem longa, cruzando o Rio Tocantins e passando pelas estradas mais precárias. Do primeiro encontro, nada muito abrupto. Eles, já bem acostumados com a presença das branquelezas, nem estranham como nós. Falam nosso português, mas entre eles só a língua mãe, o que lhes permite falar o que quiserem sem que entendamos nada. Adotaram algumas manias nossas de relógio, energia, água encanada, banda Calypso e muita roupa (o que é uma pena, porque naquele calor, tudo que eu mais queria era me desnudar).
Vivem numa situação de miséria (segundo nossa concepção), pouco plantio, muitas bocas. São reféns de um assistencialismo típico da piedade colonialista e já comungam das relações de troca dos homens “civilizados”. Isso, claro, teceu um nó gigantesco em nossa cabeça, porque queríamos de uma forma ou de outra os índios dos nossos livros. Queríamos que eles não soubessem das coisas, queríamos a ingenuidade, a vida simples, porque nutrimos uma espécie de nostalgia do primitivo (e quer primitivismo maior que a fome?). Eis, então, a primeira decepção, que veio acompanhada de um sentimento de culpa por achar que interferimos na cultura deles. Mas a interferência não acontece a todo instante? Cultura não é essa coisa louca, dinâmica e antropofágica, que deglute costumes, hábitos, idéias e vai agregando experiências? Não vou entrar nessa questão, porque só tenho formulações. Muitas coisas mudaram. Outras permanecem. Na língua, nos cantos, nos ritos, na “rotina”, no trato, nos olhares fixos com qual nos encaram ou encaram a objetiva da câmera sem pudor algum. Aliás, um olhar carregado de uma força que não se explica.
A nossa incumbência, nessa viagem, era levar os aparatos técnicos de registro e comunicação interna. Sem muita cerimônia, eles se entrosaram com aquela parafernália de máquinas e gravadores digitais e o diabo a quatro. E, de repente, surgiam filmando os rituais de cantorias, as corridas de toras, fotografando mulheres, crianças, numa atitude muito comovente, mas que contraria o nosso desejo de que eles adotem nossa mentalidade. Preocupação compreensível, porém, tardia e talvez até desnecessária, porque o processo corrosivo de dominação, que se iniciou com a invasão dessa terra e foi se disseminando Brasil afora, é irreversível. O pouco que se pode resguardar e manter vivo, já parece muito.
lorena maria

ps: foto provisória....aguardem as outras

Friday, September 22, 2006

Também tô no Youtube

Acham que é só o Aflredo, o Renatim e o Gil que aparecem no Youtube. Eu também tô no Youtube -- no bom sentido.
Aliás, conhecem a tirada do momento? Não? Ih, então "tomou no Youtube."
Chega de delongas. Tô nesse link aí embaixo. Ao lado do então governador Marconi Perillo e de um bocado de jornalistas. Atenção. O vídeo está aí para que me vejam. Mas antes que me acusem coloco um link do Maguito e o pacto com satanás

Eu e Marconi

Maguito e o capeta

Divirtam-se.

Pedro Palazzo Luccas

Mania de grandeza

Os políticos goianos sentem-se os donos do mundo. Acham que nosso
Estado -- que adoro, mas reconheço ter pouca importância no cenário nacional -- é de fato o novo eldorado. Tomara que seja. Mas, hoje, não é.
Fazia ontem matéria sobre o mapa da violência, divulgado pelo Ministério da Justiça. Ele aponto Goiás como o 4º maior em ocorrências de mortes violentas. Foram 46 assassinatos por 100 mil habitantes. O Rio lidera.

Pois bem, escrevinhei meu singelo texto e foi repercutir a informação com a Secretaria Estadual de Segurança Pública. Falo com a assessora, que desconhecia os números e acha estranho Goiás e não São Paulo estar no topo. Passo o link e peço para falar com o secretário. Quarenta minutos depois ela me retorna com um telefone e uma tese: "Isso é benéfico para a oposição, não acha?"
Respiro fundo.
Falo: "Até poderia ser. Mas, convenhamos, Goiás representa muito pouco no cenário nacional. E, não se esqueça, a pesquisa é do Ministério da Justiça com dados daí da SSP-GO.
- "É, mas o governo aqui é PSDB..." (era, agora, pelo menos em tese, é PP, penso.)
- Sim. Mas como você mesma reparou São Paulo está muito bem nessa pesquisa. Um dos menores índices. Um prato cheio para Alckmin.

Ela ainda balbucia alguma coisa que eu ignoro.
Ligo para o secretário, que mal espera eu apresentar os dados. Já fala logo da tese conspiratória. Repito meus argumentos, já sem paciência. O homem não quer papo, sugere: "Eu acho que vocês não deveriam publicar isso. Vai jogar pra cima coisa antiga que vai ser usado pela oposição" (amigo, desculpa, eu quero que oposição e governo se explodam, certo?)
Explico o valor da informação. A dificuldade de se colher dados que eles mesmo demoram a repassar e se tabular números. Ademais, 2006 nem acabou, raios!, os números seriam de quando.

O homem argumenta que não quer comentar, que assumiu em 2006 e os números ja melhoraram bastante, mas não queria criar animosidade nos grupos do governo. Mais uma sugestão: "Você pode colocar aí que eu não quis comentar. Aliás, que você não me encontrou."
-- Aí, não, secretário. Não posso sonegar a informação de que estou falando com você
-- Sou repórter. Não derrubo matérias. Se não quer falar, tudo bem. Vou continuar a escrever
-- E quem derruba. (Aqui eu já sabia que podia ir embora mais cedo)
-- Editores, editores-executivos.

Ele disse que ligaria para o diretor de redação. Aviso aos executivos, os únicos do áquario no local, que a matéria seria derrubada, mas que continuaria a fazê-la.

Três minutos depois o recado para meu editor, que intercepto: "A matéria foi derrubada por inteiro."

O dono do jornal usou os mesmos argumentos do secretário para se zangar com a reportagem. Estendo a mão a um dos meus chefes e digo: Até domingo, dia do meu plantão.

Segue abaixo a matéria censurada. Ficaria até maior. Mas, em suma, é isso.


VIOLÊNCIA
Goiás entre os líderes

Estado tem 4º maior índice proporcional de mortes violentas, com 46 ocorrências por 100 mil habitantes. Média nacional é 30.

Goiás é o quarto estado do País com maior número de crimes violentos letais, como homicídio planejado e roubo seguido de morte. São 46 assassinatos para cada grupo de 100 mil habitantes. Em 2005 registrou-se 2.584 ocorrências, numa população de 5,6 milhões de habitantes. Rio de Janeiro lidera o ranking, com 61,5 casos por 100 mil moradores, seguido de Pernambuco (58.2) e Paraná (57.4).

A pesquisa foi divulgada pelo Secretaria Nacional de Segurança Pública com base em estatísticas das secretarias de estado e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A media nacional de 2005 é de 30 ocorrências por 100 mil habitantes. Tanto no Brasil quanto nos estados, inclusive Goiás houve ligeiro aumento na quantidade de registros (veja box) de 2004 para o ano passado.

CONTRAMÃO -- Goiás está na contramão da média nacional: em 2004 registrou-se 30.5 casos no País. No Estado aconteceram 43.1 casos catalogados pela Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP), que enviou 100% dos dados pedidos pela Senasp. Enquanto os números daqui subiram a média nacional, que já era de mais de dez casos de diferença, ficou ainda maior. Apesar disso, a unidade federativa se mantém em 4ª no ranking geral.

O líder Rio de Janeiro está a 14.5 homicídios por 100 mil moradores de distância de Goiás. O estado da região sudeste tinha em 2005, segundo dados da Pesquisa Nacional de 15 milhões de habitantes. São Paulo tem um dos menores índices, 18.9. A unidade federativa menos violenta, de acordo com os dados da pesquisa -- que so conta mortes registradas pela Polícia Civil -- é o Piauí, com 9.7 casos em 2005.

Crimes violentos letais e intencionais em 2004 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)*

morte p/ 100 mil população ocorrências
1. Rio de janeiro 65.6 15.033.317 9.859
2. Pernambuco 57.7 8.238.849 4.757
3.Rondônia 46.4 1.479.940 686
4. Goiás 43.1 5.402.335 2.329
5.Espírito Santo 42.5 3.298.541 1.401

Brasil 30.5 179.108.134 54.696

Crimes violentos letais e intencionais em 2005 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)*
morte p/ 100 mil população ocorrências
1. Rio de Janeiro 61.5 15.383.422 9.467
2. Pernambuco 58.2 8.413.601 4.898
3. Paraná 57.4 10.261.840 5.886
4. Goiás 46 5.619.919 2.584
5. Rondônia 42.9 1.534.584 658

Brasil 30 184.184.074 55.312

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Crimes violentos não letais contra pessoas em 2004 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)**

ocorrência p/ 100 mil população ocorrências
1. Acre 81.1 614.205 498
2. Amapá 73 553.100 404
3. Mato Grosso do sul 65.8 2.198.640 1.446
4. Roraima 64.7 367.701 238
5. Distrito Federal 62.2 2.233.614 1.390

9. Goiás 44.1 5.402.335 2.381

Brasil 34 179.108.134 60.931


Crimes violentos não letais contra pessoas em 2004 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)**

ocorrência p/ 100 mil população ocorrências
1. Roraima 77.2 391.318 302
2. Acre 66.4 669.737 445
3. Mato Grosso do Sul 66.3 2.264.489 1.502
4. Rondônia 63.1 1.534.584 969
5. Rio Grande do Sul 61.1 10.845.002 6.629

9. Goiás 47.7 5.619.919 2.682

Brasil 34.6 184.184.074 63.565


Legenda:
* homícidio doloso, roubo seguido de morte, lesão seguida de morte e mortes a esclarecer
** Crimes violentos não letais: tentativa de homícidio, estupro, atentados violentos ao pudor e torturas


Fonte: Ministério da Justiça / Secretaria Naciona de Segurança Pública (Senasp) / Secretarias Estaduais de Segurança Pública / Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)



Pedro Palazzo Luccas

Monday, September 18, 2006

A queda de um líder


Uma história de calor, diversão, honra, derrota e honra nos confins de Salvador



Não importa se é dia ou noite, as ruas de Salvador são sempre quentes. Um calor abafado, úmido e salobro. Sorte dos turistas desacostumados com tal clima que a brisa, ou melhor, os ventos alísios refrescam o ambiente. Ou pelo menos impede que suem em bicas.

Além do alento natural, a que se observar a necessidade de repor os líquidos e sais minerais perdidos nas caminhadas pelas intermináveis ladeiras do Pelourinho e de demais regiões turísticas da cidade. Esse esforço marcou um grupo de jovens, em Salvador para fins estudantis e, principalmente, turísticos.

Da semana que passaram na cidade quase não descansaram. Ninguém queria perder um minuto de praia -- moravam a pelo menos mil quilômetros de cada pontinha de mar. O dia começava cedo e o grupo seguia quase cegamente sob a batuta do grande Bob. Bob tinha o dom natural da liderança.

Era ele quem dava a palavra final sobre os destinos dos jovens deslumbrados. Como bom democrata, consultava a todos. Em face de opiniões divergentes dava a palavra final: mais uma prova do senso de liderança.

Depois de uma tarde de morgação na tentativa de se recuperarem da noitada anterior, o grupo decide seguir para o Pelourinho. Antes passariam no famigerado Elevador Lacerda. Acontecia na praça em frente ponto turístico um ato estudantil que gerara discussões acaloradas e opiniões divergentes entre os membros.

Alheios ao ato, seguiram para o Pelô junto ao por do sol. Quinze, vinte pessoas num coletivo cheio de gente cansada e fadigada por mais um dia de rotinha. Mas para eles, não, tudo era novo. A empolgação só ficava contida pelo calor e o cansaço.

Depois de uma quase uma hora no ônibus e de frente a morfeu, enfim os estudante chegam ao portal do Pelô. O cansaço vai vagarosamente sendo substituido pela alegria de conhecer o novo. O ato tinha chegado ao fim e eles poderiam curtir sem preocupações.

Grande líder Bob, sedento, compra naquela lanchonete onde o pingado representa um perigo real uma garrafa daquelas vistosas de líquido energizante Gatorade. Sabor morango. Um uma delícia, geladinho, dizia a feição do líder. O negócio estava tão gostoso que o bocal da tampa foi descartado, só pra que o líquido fluísse mais rápido.

Trinta passos, cinco centavos na catraca e quatro bons goles. Bob e seus intrépidos amigos passaram pelo curralzinho e já estão diante o elevador lacerda do lado direito de quem desce. Uns cinco ou seis baianos esperam o transporte com cara de preguiça. Do lado de fora da cercania, um garoto maroto (perdão pelo trocadilho cafajeste, não resisti).

"Ô, tio, me dá um golinho?" A turma toda estava cansada. Poucos viram a exitação do líder. Foram frações de segundo em que ele olhou para a adocicada bebida e para o garoto. Uma criança dessa não pode fazer nada de mal, pensou. A hesitação, por certo, era da boca, que há muito não devia ver uma escova.

Entregou o Gatorade ao garoto, quase sem retornar o braço, pronto para pegar de volta.

Um. Dois. Três. Quatro. Cinco.

Cada segundo era um passo da criança rumo à liberdade das ruas. Peco em não lembrar, mas creio que ele teve a dignidade de agradecer.

Esses segundos foram uma eternidade. O riso, não, não, a gargalhada cumplice veio acompanhada do dedo em riste na direção de Bob. Toda a liderança desmoralizada em cinco segundos. Por uma criança. Depois de refletir as testemunhas concluem que só mesmo uma criança teria esse poder.

Aquele rosto é indescritivel. Um misto de raiva e compaixão, característico dos grandes líderes populares. O franzir das sobrançelhas é o reconhecimento da derrota. Elevador abaixo em alta velocidade, Bob encontra amparo nos braços de Iracema. O pensamento, só estava em um lugar: como estaria gostoso aquele último gole de Gatorade.

Pedro Palazzo Luccas

Tuesday, September 12, 2006

O restinho do presidente


Novamente as eleições. Eu já tinha prometido ficar de férias desse assunto, porque sofro com tanta insanidade, mas de tanto fugir é que dei de cara. E a merda é que a política envolve. Você toma partido, você se ofende com os comentários no ônibus, começa a discutir no supermercado e por aí vai! Mas percebo que a descrença tornou-se domínio público. Ninguém tem saco para esse formato antigo de política. E não é por pouco.

Hoje, uma senhora veio me dando uns conselhos ótimos no ônibus : "Eu acho engraçado que eles falam pra escolher certo, não desperdiçar o voto. Mas me diz quem acerta? Porque a gente vota tentando acertar, mas nunca dá certo. Se pudesse votava nulo pros político vê que a gente não quer eles lá!" Invejei seu discernimento!

Urubuzando

Quem jornaliza nessa época, vê cada maracutaia. No debate realizado na TV, os candidatos quase se estapeando no ar e depois riam e batiam um bom papo de amigos nos intervalos. Sem contar nas tretas mais descaradas em que eles enfiam a cara. E o vexame não fica só por conta deles. Os jornalistas me saem com umas perguntinhas mais descabidas e tendenciosas, que convenhamos, faltam pregar o adesivo da coligação para entrevistar os caras! Sejamos discretos, já que éticos....
Ontem o presidente da república apareceu por aqui. Eu, por mera curiosidade, fui cobrir. Particularmente, achei tudo muito estranho. Aquele salão de luxo, aquele mar de gente com um adesivinho lula-maguito que mais parecia uma cápsula de resfenol! Que dança de rato é essa? Lula apóia Maguito que é contra Barbosa que apóia o Lula. Comentei com um amigo que aquilo era constrangedor e ele me diz: não mais que Lula e Newton Costa. Haja estômago!

Depois de uma hora e meia de espera, ao som de um jingle de péssimo gosto (eu tôcansado de ser levado no bico, xô passarinho, o meu voto é no Maguito), um locutor de rodeio anuncia a trupe: Íris, Maguito, Tarso Genro, Ney Moura, Marta Suplicy e o presidente. O Íris abre com uma pregação eloqüente. Depois vem o Ney, personificando o caricato político de Saulo Laranjeira. Em seguida, entra a vice de Maguito, a psicóloga de auto ajuda Onaide Santillo. Eufórico, o Maguito, encarnado nele mesmo, arregaça a garganta para tentar convencer.

E para o gran finale vem o presidente, que até então estava compenetrado assinando uns papéis, de costa para a massa peemedebista, enquanto seus amigos lhe falavam. Usou os mesmos macetes: citações, frases de efeito e futebol! A coletiva foi cancelada e eu, pensando que talvez o Lula tivesse ido ao banheiro, tento sorrateiramente invadir a área vip, enquanto o jornalistas cercam o Maguito. Nem sombra de presidente. Só restou ir furtar um resto de quitutes que os candidatos haviam deixado no coffee break.

Depois dessa dose forte de politicagem, eu tenho pensado seriamente em poupar os políticos que ainda não se "adesivaram" com o poder. Temo muito em colocar esses distintos senhores na "máquina mortífera", engessada e corrompida do sistema político. Não adianta ter bom coração, caráter e governabilidade. Já dizia Frei Beto, governar não é ter poder. Então por que estragar a vida de um cidadão politicamente correto com um mandato, né não?!


Lorena Maria (repórter da tv cultura rs)

Ah, ao menos me rendeu uma matéria no portal Terra! O nome é da minha superior mas o texto é meu. Não compensa muito ir lá, mas de qulaquer forma:
http://multimidia.terra.com.br/jornaldoterra/eleicoes2006/interna/0,,OI81379-EI5767,00.html

Saturday, September 09, 2006

Geralllldo!!!!!


Angar do Aeroporto de Goiânia, 04/09 - 15:30 . Na entrada, alguns cabos eleitorais pingados flanulam displicentemente suas bandeiras numa tentativa de recepção nem tão insossa. Nada demais, afinal, nem todos arriscaram recepcionar o Geraldo no desembarque para extrair pronunciamentos exclusivos.

Acompanhava a Fabiana Pulcineli, repórter de política do Popular, e juntos esperamos mais de quarenta minutos pela chegada do avião vindo de Jataí: matando copinhos de água morna e tentando decifrar informações de rostos desconhecidos.

No saguão, quem se destacava era um grupo que estufava o peito demonstrando o adesivinho minúsculo e vagabundo com o rosto de Alckmim, juntamente ao lado de um brasão portentoso com o número 15, circunscrito com a frase "Uma Nova Onda".

Uma atitude dúbia e muito comum de comitês jovens de partidos, que costumam lançar movimentos non sense, sem qualquer repercursão. A dúvida na cabeça da galera era evidente: Quem eram os estranhos no ninho tucano?? Até que Fabiana perguntou sobre o que se tratava tal manifestação para um dos rapazotes que tinha o peito decorado. Solícito e forçando uma ar de naturalidade, o carinha explicou que se tratava da frente Maguito(PMDB)- Geraldo(PSDB), encabeçada pelo Mauro Miranda. "Tem mais de cinquenta ali atrás, juntos com o Mauro", reforçou. Na verdade, não passavam de vinte, todos jovens, sorridentes, fazendo piadinhas e circulando em volta de um Mauro Miranda sexagenário.

Enfim, o Avião:

Descem junto com Geraldo: Lúcia Vânia, Alcides e Marconi. É primeiramente vetado o avanço dos jornalistas, contidos na porta do saguão e acalmados por uma promessa de coletiva logo após uma rápida reunião. Ao passar pelo salão, Geraldo (primeira impressão: mais baixo e mais curvado do que a figura televisiva) é recepcionado por duas mulheres - balzaquianas, perfumadas e envoltasem um figurino muito além do a situação requeria. Ambas são abraçadas e beijadas por um Geraldo mauricinho que numa tentativa de forjar um ar mais galanteador pronuncia : "PODEROSAS!!".

Neste momento, ao fundo, Cidinho passava reto sem cumprimentar ninguém e encarando rapidamente a imprensa com aquele olhar meio acuado(sempre de baixo para cima). Os recém chegados e mais alguns deputados tucanos, que também estavam em Jataí, dirigiram-se a uma sala do angar onde se encontrava Mauro Miranda e sua trupe sangue-novo. Não se sabe o que se tratou ou as formas de tratamento que se deram por lá.

Chega então o momento da coletiva. Posicionado em frente às câmeras e gravadores, descontraído, Geraldo tenta uma piadinha: "Oi, eu sou o Geraldo!".
Ao seu lado esquerdo, o ex-governador Marconi Perillo, e, logicamente em seu lado direito..........Leréia!!!

Não sei se avisaram enfaticamente ao Cidinho (candidato ao governo do estado) que o Leréira(deputado estadual do PSDB) estava na área. É lógico que ele sabia, mais acho que só foi perceber realmente a presença do parrudo deputado quando este já ocupava seu lugar ao lado de Geraldo na coletiva.

Leréia é um dos parlamentares que melhor sabe se posicionar em eventos políticos. Ocupa bem os espaços, abre caminho fácil em multidões, não é deslocado com qualquer empurrão. Seria um centro-avante de destaque, sempre no local certo, onde a bola acaba sobrando na área. Foi necessário Marconi, rapidamente, intervir e já no início das filmagem puxar Cidinho, perdido no fundão, para a linha de frente.

Já devidamente posicionados, Alckmin se destacava sendo o ponto pálido entre os demais.Vestia um casaquinho beje, sem graça, como um senhor com frio que sai pra comprar pão pela manhã.
Poucas perguntas, respostas já mastigadas e, quando de fato precionado, proferia evasivas (como ao tratar a crise local entre PFL e PSDB, que apenas enfraquece sua campanha - como vem acontecendo em outros estados).
"Não há crise, o PFL compareceu em Jataí, com o Vilmar Rocha", saiu-se com essa.

Centro de Convenções:

Local do discurso. De onde todos partiriam para a passeata pelo centro da cidade.O carro chega arrastando os que se posicionaram na porta dos fundos do complexo, para a receptividade. Pelo corredor humano formado, passa a pick-up trazendo Cidinho e Geraldo. O carro de Marconi ficou logo atrás, impossibilitado de passar. Necessitou Perillo saltar do automóvel e sair correndo atrás do carro principal, junto com cabos eleitorais e repórteres que viam gradativamente os portões se fechando.

O pavimento inferior do Centro de Convenções se encontrava lotado: cerca de duas mil pessoas, de acordo com a polícia militar. Um aglomerado não muito heterogêneo, formado em sua maioria por cabos eleitorais e funcionários públicos comicionados.

Após os agradecimentos de Lúcia Vânia (neste ano, responsável pela coordenação da campanha de Alckmin em Goiás), Marconi tomou posição no palanque. Rouco, pediu inicialmente palmas para Geraldo, e que todos gritassem juntos: Ge-Ral-Do!...Ge-Ral-Do!..... Sendo seguido pela platéia.

Fez o mesmo com Cidinho: Al-Ci-Des!...Al-Ci-Des!..... Neste momento, todos os convidados sentados na primeira coluna, de mãos dadas, levaram Alcides à frente do palco, para que o candidato canalizasse a energia e a responsabilidade do evento.

E tão logo Perillo deu início as primeiras palavras, o público, instintivamente, recomeçou o coro: Mar-Co-Ni!........

Mesmo com a voz rouca, o ex-governador conseguiu manter uma animosidade em seu discurso. Trechos incendiários, em que touxe para si a responsabilidade do renda cidadã e bolsa escola, programas copiados pelo governo de São Paulo. Frisou: "O Geraldo reconhece que a idéia desses programas vieram de Goiás". A bem da verdade, em suas propagandas, Alckmin creditava a si a elaboração dos programas.

Resgatou-se Mário Covas, que passa a ser trabalhado pelo PSDB na tentativa de elaboração de um mito tucano. "O Geraldo é da escola de Mário Covas".

Fez desafios e promessas ao "futuro Presidente", pedindo a conclusão da Ferrovia Norte-Sul e a criação de mais duas universidades federais em Goiás(em Jataí e em Catalão).
Elencou todas as áreas: produtores rurais, segurança pública, saúde...Falou cerca de vinte e cinco minutos, até não mais restar resquício de voz.

Restou ao Cidinho a difícil tarefa de manter o tom de animação. Algo complicado para alguém que ainda se sente desconfortável sobre o palanque.

Transparecia no discurso do pepista a falta de cacoete político e o desejo imerso de que aquilo terminasse o mais rápido possível. Discursou por cinco minutos, apenas reiterando aquilo que já havia sido dito. Tentou arrancar aplausos em momentos de euforia claramente ensaiados, que perdem, por si só, a naturalidade.

Embarcou na onda de Geraldo e seu choque de gestão, sem realmente dizer quais seriam as ações. Referiu-se mais aos seus companheiros do que a ele próprio (bem característico de tímidos que se envergonham ao falar bem de si mesmo), e fechou reafirmando seu desejo em ser o instrumento da continuidade, frase cunhada duas vezes antes de deixar o microfone.

Geraldo , agora sem seu casaquinho beje e com as mangas da camisa arriadas refletia aimagem do genro que toda nora pediu a Deus: limpinho, de boa procedência, munido com frases bem trabalhadas... E já que Lula quer ser Getúlio Vargas, Alckmin se apega então a JK, relembrado o homem que em Jataí, há 51 anos, anunciava a criação de uma nova capital no cerrado.

Na porção final do discurso, e para alívio dos aliados, passou a despejar críticas mais duras contra o PT e de forma mais direta contra Lula - sem esquivas ou meias palavras.

Contra o pífio desempenho das pesquisas garantiu:
"Agora que a campanha tá começando, agora que o voto começa a ser decidido!"

E voltou-se contra a imprensa numa enigmática declaração:
"Eu tenho visto companheiros da imprensa de pouca fé. Esse povo de pouca fé teve um tira-teima hoje aqui em Goiás. Hoje é a prova de que o país( referente às pesquisas) vai mudar"

Finalizou o com o trecho da música de Gil: "Sonho que se sonha só é só um sonho, mas um sonho que se sonho junto se torna realidade"...
Comprovando o seu distanciamento com o povo ao buscar frases bem encaixadas, mas que não conseguem chegar até um nível de sentimento profundo do povão. Duvido se após quinze minutos, alguém da platéia conseguiria reproduzir a frase de encerramento do discurso de Geraldo.

Pernadas:

Grande parte da bancada tucana e mais alguns jornalistas se expremem no momento de descida do Centro de Convenções para a passeata pelo Centro. Seguranças fazem seus serviços isolando os candidatos à forceps. Tensão. O grupo principal deságua à frente. Tento achar Fabiana no meio do bolo e acabo ficando para trás.

No momento de afunilamento para passar pelo portão, inicia-se ao meu lado um desentendimento de um cabo eleitoral com um engraxate bronco, que acabou sendo empurrado sem querer. Justo quando ninguém conseguia se deslocar de acordo com seus interesses, sendo simplesmente levados pela massa, o engraxate entra em crise de fobia e começa a gritar, armando o braço para um soco: "Não me encosta porra! Não me encosta!!" - como se isso fosse possível.
O desespero do cabo eleitoral, logo atrás, sob a iminência de um soco, foi aliviado por outros militantes que impediram a pancada.

Passado o aperto do portão, a massa cai na rua velozmente. Nesse momento, o cume da passeata já se encontrava a mais de uma quadra de distância, e em ritmo acelerado. Tendo alcançar a linha de frente e atravessar a baderna de bandeiras que flanulam sem se preocupar com cabeças alheias. O turbilhão parece te envolver impossibilitando que se escape do tumulto. Sinto como se pegasse uma onda quebrada e mesmo tentanto chegar a superfície, não conseguisse sair do caldo. Foi preciso uma volta por fora, em ruas paralelas, para vislumbrar a passeata pela frente, longe da arrebatação da massa confusa.

Nas ruas do centro e nos prédios em volta houve pouca comoção. Apenas alguns comerciantes e os já tradicionais habituês do centrão, observando introspectos o aceno de braços. Muito mais curiosidade do que apoio político em si. De algumas janelas pessoas acenavam, poucas, outras arremessavam papeis picados(que podem ter sido feito pelos próprios comitês).
Produtoras em pólvora tentavam captar rostos mais animadinhos pelas calçadas ou algum garotinho no ombro do pai, com uma cara de aceitação pura e incontestável. Coisa difícil!

O destaque ficou por conta de uma velhinha que, ao chamado de Marconi, partiu em disparada da calçada rumo ao abraço dos candidatos, no centro do tumulto. Atravessou rasante e chegou aos braços de Alckmin, sendo fortemente abraçada e já deixada para trás, devido o ritmo incessante da caminhada. Até então, não se sabe sobre seus resquícios. A velhinha foi engolida pela turba e talvez tenha virado poeira urbana.

Ao final da Rua 3, próximo ao Eixo Anhanguera, a dispersão se dá de forma rápida e sem cerimônias. Sem acenos ou palavras finais. Candidatos adentram seus veículos e disparam. Pronto!

Já dentro do carro rumo à redação, recosto no banco e uma sensação de alívio acompanha o pôr-do-sol. Alguns flashes retrospectivos pipocam desordenados, um cansaço gostoso nocorpo, mas nenhuma música me vem à cabeça neste momento.

João Gabriel de Freitas

Thursday, September 07, 2006

A importância de saber ler e escrever!


Se não me escutam, eu falo com o papel e a caneta!!!

Poder vivenciar o dia a dia de uma "grande" cidade, como Goiânia, é uma experiência e um aprendizado incalculável.
Vamos ao caso deste cidadão da foto.
Já estou acostumado a vê-lo pelas ruas do centro passando pelos pontos de ônibus a pedir algo ou simplesmente sentado a conversar com si mesmo...

Quando eu o percebi ali, uma moça tomava de suas mãos a caneta que tinha lhe cedido, pois seu ônibus acabava de chegar. Ele me vendo com uma mochila escolar, logo em seguida, me pediu uma caneta emprestada. Como sempre perco minhas canetas e já me acostumei a carregar um monte, falei que podia ficar com aquela. Ele agradeceu sorrindo e voltou para sua concentração.

Em outras situações, muitas pessoas, não todas, acabam saindo de perto ou olhando com desconfiança quando ele se aproxima.

Mas ele, a meu ver, nem percebe. Continua em seu mundo, sem notar o que se passa ao redor! Ou então está tão acostumado que não se incomoda mais.

Nesta sociedade excludente onde o diferente é separado, seja por meios institucionais ou pelo olhar discriminatório das pessoas, o alento da escrita consegue dar forças para encarar e diminuir este tipo de preconceito.

Como é bom escrever nos momentos de descrença e tristeza. Poder expor no papel, ou no computador, nossas alegrias e vivências.
O poder da escrita não se compara com nada, é uma coisa de dentro da gente que nos ilumina e regenera...
Foi justo o que eu notei quando me deparei com este homem escrevendo. O prazer, a vontade, a determinação estavam escancarados em seus gestos e em seus olhos. O barulho das conversas ou dos ônibus não tiravam sua concentração. Nem o flash da câmera ele percebeu. Nada o tirou daquele momento prazeroso e saciante da escrita...

Fiquei muito curioso para saber o que estava sendo escrito naquelas linhas, mas não quis interrompê-lo. Preferi deixá-lo do jeito que estava, imerso em seu universo.
Depois de quase meia hora meu ônibus chegou, e lá ele continuou sem perceber minha partida... Só pude me despedir mentalmente. [Até mais e obrigado!].

Vasconcelos Neto

Monday, September 04, 2006

Passageiro [remixmodeon]


As notícias cotidianas chegam como um ruído aos meus ouvidos. Ligo uma música. O pequeno suspense das notas graves é suavizado pela melancólica síncope no piano. Esse jogo é levado em crescendo até que suaves acordes de uma guitarra entram em cena favorecendo a vizualização de um ambiente mais intimista. Intimismo em amplas galerias. Cavernas e pubs, ecos da aventura humana na América. O piano volta à cena, as pulsações do baixo podem ser ouvidas por entre as ligeiras frestas. Um silêncio preenchido pela imaginação. O piano cessa. Quem me conduz agora são os sons graves, quase inaudíveis, por isso mesmo delíciosos, do baixo. Esse som grave carrega meu corpo com um roçar, sinto-me, em segundos, leve, flanando entre becos esquecidos de alguma cidade chuvosa onde observo a frágil tristeza dos transeuntes, a violência voraz dos automóveis, a vertigem dos arranha-céus - saboreio morangos. Uma criança com roupas vermelhas me observa. A insistência de alguns acordes servem como mote para o suave retorno. O som do piano, não mais sincopado, ameno, belo, me ampara em seus braços. Retorno com um sabor agridoce em meus lábios.

Levanto-me e saio. Ouço o ruído das notícias descer pela sarjeta das ruas do meu bairro. Sigo subindo a rua [o vento por aqui é mais frio]. A pequena solidão de observar o cotidiano de pessoas desconhecidas me deixa alegre. Continuo o meu caminho por entre as ruas vizinhas e a contente sobriedade das casas pequeno-burguesas, olho de soslaio para a sarjeta e sorrio.

Carlos Eduardo a.k.a contra

Friday, September 01, 2006

Poemas para determinados instantes

No outro dia

A fumaça ainda na garganta.
O álcool ainda na saliva.
A boca quente, os olhos pálidos,
Cheios de lágrimas que não caem.
Tudo dormente. A alma pesa,
Presa ao corpo sujo.
Doem os músculos.
Os cheiros vêm, as cenas passam.
Tudo suspenso no ar.
Tudo deseja não acordar

Térreo
Desencontrada.
Sem chão de estrelas,
nem ponte, nem lona. Despejo.
Perdida em todas as esquinas.
Indigente de si mesmo.
No espelho, o que vê são outras
Chega o frio, enrijecendo o riso.
Cada dia mais rouca.
Na rua, a voz não ecoa.
Sobras do passado não se requentam.
Lorena Maria
(ou quem sabe um pseudônimo?)