Friday, September 22, 2006

Mania de grandeza

Os políticos goianos sentem-se os donos do mundo. Acham que nosso
Estado -- que adoro, mas reconheço ter pouca importância no cenário nacional -- é de fato o novo eldorado. Tomara que seja. Mas, hoje, não é.
Fazia ontem matéria sobre o mapa da violência, divulgado pelo Ministério da Justiça. Ele aponto Goiás como o 4º maior em ocorrências de mortes violentas. Foram 46 assassinatos por 100 mil habitantes. O Rio lidera.

Pois bem, escrevinhei meu singelo texto e foi repercutir a informação com a Secretaria Estadual de Segurança Pública. Falo com a assessora, que desconhecia os números e acha estranho Goiás e não São Paulo estar no topo. Passo o link e peço para falar com o secretário. Quarenta minutos depois ela me retorna com um telefone e uma tese: "Isso é benéfico para a oposição, não acha?"
Respiro fundo.
Falo: "Até poderia ser. Mas, convenhamos, Goiás representa muito pouco no cenário nacional. E, não se esqueça, a pesquisa é do Ministério da Justiça com dados daí da SSP-GO.
- "É, mas o governo aqui é PSDB..." (era, agora, pelo menos em tese, é PP, penso.)
- Sim. Mas como você mesma reparou São Paulo está muito bem nessa pesquisa. Um dos menores índices. Um prato cheio para Alckmin.

Ela ainda balbucia alguma coisa que eu ignoro.
Ligo para o secretário, que mal espera eu apresentar os dados. Já fala logo da tese conspiratória. Repito meus argumentos, já sem paciência. O homem não quer papo, sugere: "Eu acho que vocês não deveriam publicar isso. Vai jogar pra cima coisa antiga que vai ser usado pela oposição" (amigo, desculpa, eu quero que oposição e governo se explodam, certo?)
Explico o valor da informação. A dificuldade de se colher dados que eles mesmo demoram a repassar e se tabular números. Ademais, 2006 nem acabou, raios!, os números seriam de quando.

O homem argumenta que não quer comentar, que assumiu em 2006 e os números ja melhoraram bastante, mas não queria criar animosidade nos grupos do governo. Mais uma sugestão: "Você pode colocar aí que eu não quis comentar. Aliás, que você não me encontrou."
-- Aí, não, secretário. Não posso sonegar a informação de que estou falando com você
-- Sou repórter. Não derrubo matérias. Se não quer falar, tudo bem. Vou continuar a escrever
-- E quem derruba. (Aqui eu já sabia que podia ir embora mais cedo)
-- Editores, editores-executivos.

Ele disse que ligaria para o diretor de redação. Aviso aos executivos, os únicos do áquario no local, que a matéria seria derrubada, mas que continuaria a fazê-la.

Três minutos depois o recado para meu editor, que intercepto: "A matéria foi derrubada por inteiro."

O dono do jornal usou os mesmos argumentos do secretário para se zangar com a reportagem. Estendo a mão a um dos meus chefes e digo: Até domingo, dia do meu plantão.

Segue abaixo a matéria censurada. Ficaria até maior. Mas, em suma, é isso.


VIOLÊNCIA
Goiás entre os líderes

Estado tem 4º maior índice proporcional de mortes violentas, com 46 ocorrências por 100 mil habitantes. Média nacional é 30.

Goiás é o quarto estado do País com maior número de crimes violentos letais, como homicídio planejado e roubo seguido de morte. São 46 assassinatos para cada grupo de 100 mil habitantes. Em 2005 registrou-se 2.584 ocorrências, numa população de 5,6 milhões de habitantes. Rio de Janeiro lidera o ranking, com 61,5 casos por 100 mil moradores, seguido de Pernambuco (58.2) e Paraná (57.4).

A pesquisa foi divulgada pelo Secretaria Nacional de Segurança Pública com base em estatísticas das secretarias de estado e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A media nacional de 2005 é de 30 ocorrências por 100 mil habitantes. Tanto no Brasil quanto nos estados, inclusive Goiás houve ligeiro aumento na quantidade de registros (veja box) de 2004 para o ano passado.

CONTRAMÃO -- Goiás está na contramão da média nacional: em 2004 registrou-se 30.5 casos no País. No Estado aconteceram 43.1 casos catalogados pela Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP), que enviou 100% dos dados pedidos pela Senasp. Enquanto os números daqui subiram a média nacional, que já era de mais de dez casos de diferença, ficou ainda maior. Apesar disso, a unidade federativa se mantém em 4ª no ranking geral.

O líder Rio de Janeiro está a 14.5 homicídios por 100 mil moradores de distância de Goiás. O estado da região sudeste tinha em 2005, segundo dados da Pesquisa Nacional de 15 milhões de habitantes. São Paulo tem um dos menores índices, 18.9. A unidade federativa menos violenta, de acordo com os dados da pesquisa -- que so conta mortes registradas pela Polícia Civil -- é o Piauí, com 9.7 casos em 2005.

Crimes violentos letais e intencionais em 2004 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)*

morte p/ 100 mil população ocorrências
1. Rio de janeiro 65.6 15.033.317 9.859
2. Pernambuco 57.7 8.238.849 4.757
3.Rondônia 46.4 1.479.940 686
4. Goiás 43.1 5.402.335 2.329
5.Espírito Santo 42.5 3.298.541 1.401

Brasil 30.5 179.108.134 54.696

Crimes violentos letais e intencionais em 2005 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)*
morte p/ 100 mil população ocorrências
1. Rio de Janeiro 61.5 15.383.422 9.467
2. Pernambuco 58.2 8.413.601 4.898
3. Paraná 57.4 10.261.840 5.886
4. Goiás 46 5.619.919 2.584
5. Rondônia 42.9 1.534.584 658

Brasil 30 184.184.074 55.312

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Crimes violentos não letais contra pessoas em 2004 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)**

ocorrência p/ 100 mil população ocorrências
1. Acre 81.1 614.205 498
2. Amapá 73 553.100 404
3. Mato Grosso do sul 65.8 2.198.640 1.446
4. Roraima 64.7 367.701 238
5. Distrito Federal 62.2 2.233.614 1.390

9. Goiás 44.1 5.402.335 2.381

Brasil 34 179.108.134 60.931


Crimes violentos não letais contra pessoas em 2004 (ranking de ocorrências por 100 mil habitantes)**

ocorrência p/ 100 mil população ocorrências
1. Roraima 77.2 391.318 302
2. Acre 66.4 669.737 445
3. Mato Grosso do Sul 66.3 2.264.489 1.502
4. Rondônia 63.1 1.534.584 969
5. Rio Grande do Sul 61.1 10.845.002 6.629

9. Goiás 47.7 5.619.919 2.682

Brasil 34.6 184.184.074 63.565


Legenda:
* homícidio doloso, roubo seguido de morte, lesão seguida de morte e mortes a esclarecer
** Crimes violentos não letais: tentativa de homícidio, estupro, atentados violentos ao pudor e torturas


Fonte: Ministério da Justiça / Secretaria Naciona de Segurança Pública (Senasp) / Secretarias Estaduais de Segurança Pública / Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)



Pedro Palazzo Luccas

4 comments:

Anonymous said...

E o pior é que o índice desse ano deve apontar maior elevação. É ao menos a impressão tirada em conversas com todos os repórteres policiais do pop. Em Aparecida tão matando a toque de caixa!

Anonymous said...

caralho, Pedro, não havia lido isso aqui não [vc mesmo se boicotou atropelando seu próprio texto com os links do youtube]. enfim... que sujeira! o lance é esse mesmo, se o manda-chuva lá não deixou publicar, bota na rede. gostei!

Abraços!

Carlos Eduardo

Anonymous said...

Oi Pedrinho!!! Estou muitíssimo atrasada, mas hj foi a primeira vez que entrei no blog de vcs... Gostei da sua atitude e acho que deve repeti-la sempre que boicotarem alguma matéria sua que considera relevante.

Bjos

Paulinha Arantes

Anonymous said...

necessario verificar:)