Tuesday, August 29, 2006

Tempos em tempo

O compasso do relógio marcava o ritmo da angústia crescente, cada vez mais escura e pesada. Os olhares dispersos pelos cantos do quarto, da sala, do banheiro, pendiam-lhe a cabeça. Lamúrias e lamentos em meio à bagunça das quatro paredes amarronzadas. Nunca tinha lhe parecido tão difícil se arrumar. Pensar que as coisas se encaixariam mais facilmente em meio ao hermetismo medíocre das neuroses. Besteira!

O tempo não passava. Nem toda a diversão do mundo parecia-lhe o bastante. Mas, é isso aí, pensava. Demora, mas, sim, o tempo passa. Passa e traz novas e velhas novidades. Restava-lhe esperar por elas. Só não sabia se o ideal era esperar ou correr atrás. Tanto comodismo... Tudo parecia tão trabalhoso. Ter que traçar estratégias e medir palavras o cansava.

Cada acorde mais agudo numa guitarra qualquer lhe enturvecia a cabeça. Aparecia de volta aquele olhar. Olhos de ressaca? Só se fosse do álcool intenso e cansativo que ingeria. Porra, o mundo inteiro esta lá fora e o cara lá, meio que saboreando, remoendo aquela coisa ruim. O problema é que existem lembranças. Ele travava, sem muita vontade, de apagá-las. Passava um disco pra trás dos outros. Evitava ouvir um ou outro CD. Nas roupas se complicava ainda mais: não sabia como fugir da relação imediata.

Mas nos crepúsculos é que se doia. A idéia do sol indo embora, dos móveis perdendo luz e do mundo ficando cada vez mais silencioso o assombravam. Sempre assombraram. Um cigarro não era remédio suficiente. Sentia que aquilo aumentava o tique-taque implacável do relógio. Não era o instrumento o problema. As engrenagens da máquina iam bem. As dele, não. Mas o tempo passa para todos. Passaria para ele também.

Pedro Palazzo Luccas

4 comments:

Anonymous said...

Fim de férias???

Anonymous said...

Sentimentos profundos...

Lorena said...

Eh, é possível fugir daquele clichê trágico: "com o tempo passa". Basta saber reescrever o tempo.

Anonymous said...

Que intenso isso, Pallazo. Gostei!